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sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A Tecnologia e a Dessocialização

A Tecnologia e a Dessocialização




     Não há dúvidas de que a tecnologia vem avançando nas últimas décadas a passos de gigantes. Sabemos o quanto ela tem progredido e fazendo progredir em quase todos os pontos de vista da vida da humanidade, como a ciência, a pesquisa, a história, a educação e até a política. Mas será que todos que temos o acesso à tecnologia e ao seu avanço galopante, sabemos distinguir o benéfico do maléfico?
     De uma forma simples e superficial podemos iniciar a nossa análise, ponto por ponto, buscando ver sempre os dois lados, as duas faces desse paradoxo.
     Do ponto de vista da ciência, podemos encontrar os diversos ramais em que a tecnologia e seu avanço, são positivos.
     A medicina hoje já conta com a possibilidade de estudar, compreender e testar órgãos e organismos virtuais, sem que seja necessário o sacrifício de um ser vivo.
     A engenharia civil e a arquitetura já conseguem fazer seus projetos e cálculos virtuais, sem mais a necessidade da prancheta, as réguas, os compassos, o lápis, a borracha e ainda consegue também decorar seus imóveis virtualmente sem a necessidade do espaço físico existir com seus devidos móveis e decorações, no caso de um imóvel residencial ou empresarial.
     A química, a biologia e seus diversos segmentos, conseguem visualizar a menor partícula, fazer cruzamentos de dados genéticos, pesquisarem as substâncias nocivas ou não para a utilização pelos humanos, os efeitos que podem trazer para o planeta e consequentemente para a existência humana e sua qualidade de vida.
     Através da tecnologia conseguimos desvendar muitos mistérios, assim considerados no passado, como o processo da mumificação, a idade dos fósseis com o carbono 14, compreender melhor como se deu a história da humanidade desde quando existem registros, visualizar as distâncias percorridas pelos grandes heróis e personagens.
     A pesquisa se tornou farta, acessível, disponível e com possibilidades de discussões, além do grande fato de ser menos caro que a compra de um livro. Podemos pesquisar quaisquer assuntos, científicos ou não, ter acesso a resumos de grandes obras literárias, às imagens de grandes obras artísticas, a discursos, a fatos ocorridos em qualquer parte do mundo, seja no passado ou no presente em tempo real.
     Olhando por esse prisma, tudo parece magnífico, grandioso, excepcional... mas será que só existe esse lado?
     A tecnologia traz também o reverso da medalha, ou seja, o lado obscuro, maléfico, a dualidade inerente a tudo que se refere ao ser humano, como o bem e o mau, o claro e o escuro, o dia e a noite.
     Por questões dos sistemas políticos empregados pelas nações detentoras do poder e da soberania tecnológica e financeira, essa disponibilidade que a tecnologia e seus avanços proporcionaram à humanidade, tem um preço e este não é nem um pouco barato.
     Os mesmos capacitados pelas descobertas de programas cada vez mais evoluídos e velozes, também produzem seus “vírus” e os “antivírus” que devem ser consumidos, pois caso contrário podemos perder o acesso a todo esse “portal” para o mundo.
     Os equipamentos cada vez menores e mais eficazes fazem com que o nosso consumismo seja cada vez mais exacerbado, e aí onde fica o nosso orgulho e a nossa vaidade em não possuir esses equipamentos diante dessa nossa sociedade cada vez mais supérflua?
     Através da tecnologia se aprende a produzir bombas, se faz uma rede de pedofilia, é possível associar-se a uma rede de tráficos diversos, podemos aprofundar o nosso conhecimento tecnológico e entrar em contas bancárias alheias e roubar, podemos fuçar a vida de alguém e escolhê-la como vítima de um seqüestro, é possível exercer o voyeurismo sem que ninguém incomode ou perceba.
     Somos bombardeados diuturnamente com mensagens, em sua maior parte, inúteis ou inverídicas. Sem contar com as eternas “correntes” milagreiras e amaldiçoadoras.
    E é comum encontrarmos pessoas afirmando que o mundo está cada vez pior, que o ser humano está virando um mostro e que por isso o mundo está perto de acabar. Já pensaram, por exemplo, se na época em que Cristo foi crucificado tivéssemos essa tecnologia para assistirmos ao vivo o Seu sacrifício? O homem seria menos monstro que hoje?
     A verdade é que hoje temos acesso às notícias boas ou más em tempo real e isso une os continentes e nações com todos os prós e contras, mas o ser humano é o mesmo ser humano com suas virtudes e fraquezas, com suas ambições e indiferenças e por isso mesmo é necessário lembrar que a tecnologia criada e permanentemente progressiva foi criada por ele mesmo, e que é chegado o momento que se torna necessária a criação “filtros” emocionais, éticos, morais e racionais para o combate a esse lado paradoxal da tecnologia e sua ação na sociedade.
     A insegurança tomou conta de nossas vidas por conta desse ritmo frenético de informações e exigências que o nosso momento mundial nos impõe. Temos medo da nossa própria sombra, temos medo de dormir e não acordar, temos medo do futuro, sentimo-nos insignificantes diante desse todo já existente, achando que não há mais nada ser criado, exigimos cada vez mais de nós mesmos, trancando nossos filhos em casa em frente a todos os equipamentos tecnológicos pensando em sua segurança e acabamos por torná-los seres sem cor, sem brilho, com depressão ou vazio de afetividades que só se constrói com a sociabilidade.
    Estamos criando com isso seres humanos com dificuldade de relacionamentos, com ansiedades inexplicáveis, com sofrimentos psicopatológicos irreversíveis por que na verdade falta o alimento da nossa alma.
    Alimentamos a nossa razão, o nosso cérebro, a nossa competência ou performance, mas deixamos de andar descalços, de subir em árvores, de jogar gude, caçar passarinho, fazer castelos de areia, contar estórias, ler um livro manuseando-o e não lendo seu resumo em algum site da internet.
    É comum percebermos nas rodas de conversas, os temas divulgados pela internet, pela mídia que tanto se utiliza dessa tecnologia de forma perversa, divulgando fatos de forma massificante que ao invés de alertar e educar, acaba sugerindo àqueles que estão sempre à espreita em busca de uma nova idéia para fazer o mal ou burlar as condutas civis e morais que temos por direito. A mídia não está preocupada com valores morais e éticos, ela se preocupa com os valores monetários advindos do ibope que suas manchetes lhes dão de retorno através de seus anunciantes. A mídia é o principal vetor para que essa tecnologia e seus avanços cheguem ao seu destino final que é consumidor, que se tivesse o “filtro” mental, intelectual e educacional, não traria tantos danos, mas... vivemos num país onde a educação é remetida para isso mesmo, ou seja, para ser hipnotizada e conduzida por quem interessa essa situação de fato.
     Por isso, para finalizar, cito o trecho da versão de Pedro Bial em Filtro Solar: “ Cuidado com os conselhos que comprar,mas seja paciente com aqueles que os oferecem.
     Conselho é uma forma de nostalgia.
     Compartilhar conselhos é um jeito de pescar o passado do lixo, esfregá-lo,repintar as partes feias e reciclar tudo por mais do que vale.”
     Repensar o presente e projetar um futuro melhor seria a melhor solução, principalmente se olharmos para nós mesmos e descobrirmos o quanto colaboramos para esse estado de coisas, nos tornando distantes e insociáveis.

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